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Como a ciência resolveu o mistério do “cocoliztli”, epidemia que dizimou os astecas há 500 anos

Equipe de pesquisadores acredita ter encontrado bactéria responsável pela morte de até 80% da população indígena no México em meados do século 16.

Nem o sarampo, a varíola e o tifo provocaram tantas mortes entre os indígenas americanos como o "cocoliztli".

Em meados do século 16, a população de indígenas dos territórios que hoje fazem parte da Guatemala e do México foi reduzida em 15 milhões em um período de cinco anos.

Além dos danos que as guerras e a exploração por parte dos espanhóis causaram, uma doença desconhecida acabou com a vida de entre 50% e 80% dos nativos em duas grandes epidemias ocorridas em 1545 e 1576.

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Os surtos foram chamados de "cocoliztli", uma palavra da antiga língua indígena nahuatl, usada pelos povos astecas, que pode ser traduzida como enfermidade ou mal.

Agora, uma equipe internacional de cientistas estima que esse mal misterioso foi, na realidade, a salmonela.

Enigma

A pesquisa, publicada na segunda-feira na publicação científica Nature, Ecology and Evolution, identificou o agente infeccioso presente nos restos mortais de dezenas de pessoas enterradas sob o campo de Yucundaa-Teposcolula, em Oaxaca, no México.

Os cientistas responsáveis pelo estudo são do Instituto para a Ciência da História Humana Max Planck (MPI-SHH, na sigla em alemão), na Alemanha, da Universidade Harvard e do Instituto Nacional Mexicano de Antropologia e História (INAH).

Foi possível identificar restos da bactéria Salmonella enterica nos dentes dos cadáveres, que tem mais de 500 anos de idade.

O Yacundaa-Teposcolula é o único local onde se há registro histórico do enterro de índios que morreram por causa do cocoliztli.

É a primeira vez que esse tipo de bactéria é considerada causa de uma epidemia dessa magnitude – tida como uma das primeiras pragas do mundo.

Escritos da época dizem que a doença provocava febres altas, dores no estômago, diarreias e até hemorragia, o que levava as vítimas a morrerem em questão de dias.

Nenhum dos sintomas correspondia aos das doenças conhecidas na época, como o sarampo ou a malária.

Culpa dos espanhóis?

A salmonela foi descoberta na Europa durante a Idade Média, no período que antecedeu a chegada dos espanhóis ao território americano.

O contágio se dá normalmente por meio de água e comida contaminados, e os cientistas acreditam que o agente causador da doença pode ter chegado ao México com os animais que os espanhóis levaram em seus barcos.

"Com os dados que temos no momento, não podemos saber geneticamente se nossa Salmonella enterica Paratyphi C veio da Europa ou se já existia no México antes da chegada dos europeus", disse a principal autora do estudo, Åshild Vågene.

Mas há evidências circunstanciais, diz ela, porque não foram encontrados restos desta bactéria nos índios que morreram antes da chegada dos colonizadores.

O fato é que as cartas e documentos do século 16 que foram preservados falam, inclusive, de uma espécie de maldição divina, já que os indígenas eram os únicos que morriam por cocoliztli – os espanhóis não eram afetados.

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