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1º Natal em casa: a história da família que adotou 6 irmãos de uma só vez e agora tem 22 filhos

Joana e Olavo decidiram ampliar a família que já contava com 16 filhos adotivos. Eles acolheram em casa seis irmãos com idades entre 5 e 14 anos, que passarão o primeiro Natal em um lar.

Para Juan, 14 anos, Yago, 12 anos, Evelin, 10 anos, Nathan, 7 anos, Natália, 7 anos, e Ana Paula, 5 anos, este será o primeiro Natal num lar, com pai e mãe, árvore decorada, ceia e presentes. Até Papai Noel passou pela nova casa, uma semana antes do dia 25.

Depois de viverem boa parte da infância em abrigos, os seis irmãos foram adotados neste ano por Joana Célia de Oliveira, 60 anos, e Olavo Borba, 73 anos. Ganharam uma família com mais 16 irmãos.

«Para nós, eles são nosso maior presente. É isso que eu quero que eles saibam neste Natal», diz Joana, sentada à mesa de uma sala de estar decorada com luzes e estrelas de papel – tudo feito pelas crianças e adolescentes da casa.

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A professora aposentada nunca teve filhos biológicos. Ela e o marido, que é engenheiro e militar da reserva, passaram a vida acolhendo crianças e adolescentes sem família. Hoje, têm 22 filhos adotivos.

«É uma história que começa quando eu era pequenina e dizia que queria crescer, casar e ter muitos filhos. E que teria 24 filhos», contou Joana à BBC News Brasil.

A adoção dos seis irmãos por uma mesma família é um caso raríssimo, segundo a Vara da Infância e da Juventude do Distrito Federal, que intermediou o contato entre os seis irmãos e o casal.

A grande maioria das pessoas na fila de adoção só aceita crianças de até três anos e não quer irmãos. Joana e Olavo nunca fizeram exigências acerca da idade das crianças nem de laços familiares.

A princípio queriam adotar duas crianças ou adolescentes. Mas, quando foram informados de que poderiam escolher dois dentre seis irmãos, optaram por levar todos para casa. «Havia espaço no lar e no coração. Então, decidimos adotar os seis», explica Joana.

A BBC News Brasil conheceu a casa da família. Uma residência grande, projetada e construída por Olavo, numa região administrativa de Brasília. A sala é repleta de janelas abertas, que dão para árvores e jardins. Cada criança e adolescente tem um quarto – atualmente 14 moram lá e os outros oito já têm a própria casa.

Os seis irmãos recém-chegados já chamam Joana de mãe com naturalidade. «Essa mamãe é uma gracinha. É uma princesa», repete Ana Paula, de 5 anos.

A decisão de adotar

Joana conta que tinha 29 anos quando descobriu um problema no endométrio que a impedia de engravidar. Seria possível tentar um tratamento, mas ela e o marido optaram pela adoção.

«Decidimos ter uma grande família de filhos do coração.»

Antes da chegada dos seis irmãos, Joana e o marido adotaram ao longo dos anos 16 crianças e adolescentes. Hoje, todos eles têm mais de 18 anos- alguns estão concluindo o ensino médio, três estão na universidade e os outros já trabalham.

Foram Tatiane, 25 anos, Gabriel, 19 anos, e Camila, 22 anos, que convenceram os pais a fazerem uma última adoção.

«Nós estudamos ou trabalhamos o dia inteiro. A casa estava ficando vazia. Fomos percebendo a mãe mais triste e o pai também. Perguntamos a eles se não gostariam de ter mais filhos», relata Tatiane, que está concluindo a faculdade de pedagogia e sonha em ser diretora pedagógica numa escola do Distrito Federal.

Joana reagiu à proposta dizendo que estava «velha demais» e que não daria conta sozinha. Os filhos garantiram que ajudariam em cada passo da criação dos novos irmãos.

O primeiro encontro

Joana e Olavo se cadastraram em setembro de 2017 na fila de adoção do Distrito Federal. Em março de 2018, receberam a notícia de que seis irmãos estavam disponíveis e foram convidados a conhecê-los.

Ao falar sobre o primeiro encontro com os jovens, Joana se emociona. Preocupadas com as lágrimas da mãe, Natália e Ana Paula imediatamente a enchem de abraços e beijos.

«Eles estavam todos aguardando a chegada da gente no abrigo. Parecia que a gente já se conhecia. Até as técnicas e as psicólogas se admiraram, porque eles não sentiram receio de se aproximar, e as crianças de abrigo costumam ter dificuldade.»

A professora aposentada conta que, no momento da despedida depois desse primeiro encontro, ficou aflita com os rostinhos das crianças, receosos de não terem «agradado».

«Disseram: ‘Você não vai levar a gente? Não vai levar?’. E eu disse, ‘ainda não, mas vamos estar juntos logo», diz ela, novamente emocionada.

O processo de adoção segue um padrão de aproximação progressiva que visa proteger tanto os pais quanto os filhos, com diversas visitas antes da mudança para o novo lar.

A chegada à nova casa

Dois meses depois do primeiro encontro, os seis irmãos se mudaram para a casa dos pais adotivos. Estava se iniciando a fase de convivência, que culminaria com a decisão final de adotar ou não.

Mas os laços se formaram rapidamente. «Os pequenos já começaram automaticamente a me chamar de mãe. O mais velho, de 14 anos, demorou duas semanas», diz Joana.

E como ela e o marido fazem para administrar uma casa com tanta gente?

Joana diz que cada um tem sua tarefa, como cuidar da própria roupa, arrumar o quarto, levar o prato para a cozinha. Também há uma escala para a faxina dos ambientes comuns da casa – cada pessoa limpa um cômodo.

O casal faz as compras do mês e uma funcionária cozinha durante a semana. No fim de semana e nas férias, todos participam do preparo das comidas.

Nas tarefas diárias, os mais velhos ajudam os mais novos, ensinando, por exemplo, como amarrar o tênis e arrumar a lancheira da escola.

«Fraternidade é a palavra. É um ajudando sempre ao outro, estando sempre disponível. A casa é o laboratório para o futuro, a vida», resume a mãe.

Sustento da família

Muita gente pode se perguntar também como Joana e Olavo fazem para arcar com os custos da criação de 22 filhos. Ela explica que tudo é pago com o dinheiro da aposentadoria que recebe como professora e da remuneração do marido, que presta consultoria em engenharia e é militar da reserva.

As crianças e adolescentes estudam em escolas públicas, mas fazem curso de idiomas pagos pelos pais ou oferecidos por voluntários. Gabriel e Camila – ambos adotados quando já tinham mais de 10 anos – passaram no vestibular da Universidade de Brasília.

«A gente vive com simplicidade. Em vez de comprar na butique, compra no armazém. Em vez de viajar, passa férias aqui. Mas todos têm o que precisam», diz. «Os filhos quando vão crescendo vão se ocupando das suas vidas, trabalhando, investindo neles, em cursos, em trabalho. Financeiramente, o suporte é o pai e a mãe enquanto eles estiverem sem andar com os próprios pés.»

Adoção de adolescentes

Joana e Olavo são exemplos raros, não apenas pelo número de filhos adotivos mas principalmente pelo fato de acolherem adolescentes.

No Brasil, oito em cada 10 interessados em adotar querem apenas bebês ou crianças de, no máximo, 5 anos. Mas 73,74% das crianças e adolescentes que buscam um novo lar têm entre 5 e 17 anos, segundo dados do Cadastro Nacional de Adoção.

Joana diz que considera a experiência de adotar uma criança mais velha ou um adolescente especial, porque a aproximação acontece por decisão de ambas as partes, não apenas pela vontade dos pais.

«A adoção tardia é a oportunidade maior como pai e mãe, porque um escolhe ao outro, porque um não é obrigado ao outro. Quando se executa o processo de adoção e ele termina, é porque ambas as partes quiseram», diz Joana.

É o que aconteceu quando ela adotou Tatiana e os quatro irmãos dela, há 12 anos. A jovem tinha 13 anos na época e diz que tinha «perdido as esperanças» de ter uma família.

«Eu sabia que as crianças menores é que tinham chance. Então, eu já estava me preparando para aprender tarefas domésticas, aprender a cozinhar, para ser empregada doméstica e conseguir me manter depois dos 18 anos», conta.

Mas tudo mudou quando, num dia qualquer, ela avistou Joana chegando ao abrigo. «Quando eu vi minha mãe, quando eu olhei para ela, eu senti vontade de chegar, dar um pulo nela, abraçar bem forte e dizer: ‘você é minha mãe'», conta.

Joana diz que, assim que conheceu a menina e os irmãos, sentiu que poderia amá-los como filhos. «Ela voltou com meu pai um tempo depois e eles disseram: ‘A gente quer muito que vocês sejam nossos filhos, mas claro que só se vocês quiserem nos ter como pais’. E a gente, ‘claro que sim!'», diz Tatiane.

O amor que se constrói

Segundo Joana, o processo de adoção tem momentos bastante difíceis e é importante procurar aconselhamento e ajuda dos psicólogos da Vara da Infância quando necessário.

«A primeira lição é que você não é perfeita. Você tem que se adequar à chegada deles. É difícil para eles como é difícil para nós. O primeiro mês não é simples. Eles ficam eufóricos, e você está tentando mostrar para eles a rotina da casa, o encaminhamento.»

Segundo ela, o amor dos filhos pelos pais e dos pais pelos filhos vai se fortalecendo com o convívio.

«É um crescimento humano e de amor. É uma oportunidade ímpar de conviver verdadeiramente com outro ser humano sem exigir que ele te ame. Você trabalha para construir essa convivência, essa ponte de amor», diz.

Ao final da entrevista, quando é convidada a falar sobre o que os 22 filhos «do coração» representam para ela, as palavras parecem faltar. «Eu não consigo imaginar a minha vida sem os meus filhos. Para mim, felicidade é isso aqui.»

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