“Todo dia tem um motociclista que te fecha, buzina ou mostra o dedo”, descreve o motorista Alexandre Tavares, na profissão levando e buscando estudantes universitários há 12 anos em sua van. O motorista trabalha em Belo Horizonte, uma das maiores capitais do Brasil, seguindo uma rotina de quatro turnos. Ele passa pelo menos oito horas diárias no trânsito e sente os impactos na saúde. “Dor de cabeça, desânimo, dor nos ombros e falta de paciência”, são alguns dos sintomas que ele sente diariamente. “Nos fins de semana só quero ficar em casa”, conclui, mostrando o esgotamento causado pela rotina.
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Segundo o diretor do Departamento de Medicina de Tráfego Ocupacional da Abramet (Associação Brasileira de Medicina do Tráfego), o médico Dirceu Rodrigues Alves, os sintomas que Tavares relata são típicos de quem encara a batalha do trânsito diariamente.
O médico, que é especialista em medicina do tráfego, estima que de 80% a 90% dos motoristas sofrem de estresse, e explica que o mal tem três causas: o desgaste físico dos movimentos repetitivos, a tensão psicológica por causa das situações de risco e o desgaste social causado pelo impedimento de se chegar aonde se deseja em tempo.
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“O estresse é natural e necessário. É um mecanismo de defesa”, explica o médico, mas pode se tornar um problema quando é constante. O estresse crônico causa, desde sintomas brandos, como os de Tavares, até lesões graves no coração e infarto. “O estresse pode matar. Não há dúvida”, garante o médico. Uma vez que o estágio crônico é alcançado, o tratamento é demorado e envolve acompanhamento psicológico e psiquiátrico.
Tavares lembra de um pico de estresse, quando dirigia sua van. Há seis anos ele teve um desentendimento com um motociclista que falava ao telefone e se recusou a lhe dar passagem. A troca de palavras e gestos se agravou até que Tavares se viu arremetendo a van contra a motocicleta, na tentativa de atingi-la. O motoqueiro saiu ileso, mas o ocorrido serviu de aviso para Tavares, que se arrepende até hoje da atitude que teve.
Desde então, o motorista faz uso de um medicamento psiquiátrico para manter o controle no trânsito. “Eu vi que se continuasse daquele jeito eu ia acabar cometendo uma loucura”, relata. Ele não se considera uma pessoa agressiva e garante que, se não fosse pela profissão, não faria uso da substância.
O professor de psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e criador do Portal Psitran, Fábio de Cristo, explica que o estresse leva a pessoa à reação de lutar ou fugir.
Nessas condições, até mesmo quem é geralmente calmo pode vir a agir de forma irracional e violenta. O psicólogo ainda acrescenta que estar vulnerável às ações de outras pessoas também é um elemento estressante. “A falta de controle gera estresse.”
No entanto, a medicação psiquiátrica não é a única forma de atenuar os efeitos do trânsito. Cristo aponta algumas atitudes que podem ajudar o motorista a se proteger. A principal delas é o planejamento. O motorista deve se programar para sair com antecedência e evitar os horários de pico. Ele também deve criar um ambiente de conforto dentro do veículo, evitando dirigir com fome, fazendo uso do ar-condicionado e escutando a músicas tranquilas em volume adequado.
Alves, o médico da Abramet, acrescenta que deve-se evitar dirigir após eventos estressantes. E quando já se estiver em congestionamentos, ele sugere alongamentos e exercícios de respiração profunda. Ambos têm seu efeito comprovado na diminuição do estresse, oxigenando o cérebro e levando à produção de endorfinas que têm efeito analgésico e atenuam o desgaste.