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A universidade que renasce dos destroços deixados pelo “Estado Islâmico” no Iraque

A Universidade de Mossul está tentando se recuperar do trauma da guerra e da ocupação pelo grupo extremista.

A Universidade de Mossul, no Iraque, está reconstruindo seu campus e sua comunidade acadêmica após sobreviver a um período de trevas.

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O local foi ocupado, durante mais de dois anos, pelo grupo extremista autodenominado Estado Islâmico – e mantido sob um regime de perseguição e terror.

Após uma experiência tão traumática, e da destruição causada pela batalha para retomada da cidade, ainda há muito a ser feito.

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«A biblioteca central ainda parece um pedaço de carvão», diz Ashraf Riadh Al-Allaf, professor sênior do departamento de inglês da universidade.

Estudantes yazidis retornam

Segundo ele, o que chegou a ser um dia uma das maiores bibliotecas do Oriente Médio pegou fogo, e os principais prédios administrativos foram «completamente destruídos».

Ainda há escombros a serem removidos, diz Al-Allaf, mas os alunos estão de volta – e os acadêmicos estão reconstruindo o relacionamento com a comunidade internacional.

Há um projeto em desenvolvimento com a Universidade de Lancaster, na Inglaterra, em que a instituição britânica compartilha conhecimento e tecnologia online com seus colegas iraquianos.

A Universidade de St. Andrews, na Escócia, realizou um «dia de doação de multas da biblioteca» nesta semana – o dinheiro das multas será doado à organização Book Aid International para enviar livros à Universidade de Mossul.

No início deste ano, mais de 3 mil livros foram despachados para Mossul, e os esforços para arrecadação de fundos vão financiar uma segunda remessa.

O projeto Mosul Book Bridge foi criado por acadêmicos para ajudar a reabastecer a biblioteca de Mossul, que já contou com um acervo de um milhão de livros.

«Demorou um pouco, mas a cultura da universidade está lentamente ressurgindo», diz ele.

Sobretudo, ele avalia, é um sinal promissor ver grupos minoritários, como estudantes cristãos e yazidis, retornando à universidade.

«A simples presença deles é muito bem-vinda», acrescenta.

Ter um grupo mais diversificado de alunos parece que estamos «voltando à vida normal».

Regime de terror

Mas não é um simples final feliz. A universidade, a segunda maior do Iraque, com 30 mil estudantes, foi submetida a um regime de terror.

Poucas universidades viveram tamanha brutalidade, com o currículo e princípios éticos sendo reformulados em torno da ideologia e dos esforços de guerra do regime do Estado Islâmico.

Na época, os acadêmicos descreveram o clima de medo, com livros sendo queimados, casos de espionagem, disciplinas como literatura sendo banidas e ameaças de punição.

Os funcionários da universidade que permaneceram em Mossul «foram forçados a ir trabalhar e o fizeram de forma relutante por medo de perder suas vidas», diz ele.

Entre eles, há um «desejo de esquecer».

Quando a universidade foi liberada, se viu diante da destruição provocada por ataques terrestres e aéreos.

«Alunos e funcionários são gratos por estarem de volta. No entanto, ainda há medo», diz Al-Allaf.

Sensação de insegurança

O legado psicológico da guerra e a ocupação do Estado Islâmico ainda ecoam pela cidade.

A sensação de insegurança está profundamente enraizada. Ele diz que há um medo residual de um possível retorno do terrorismo – e uma irritação com a corrupção no pós-guerra.

«Há pouco otimismo», afirma.

Há também o receio de que, embora o conflito tenha terminado, ainda não exista empenho suficiente para apoiar a universidade e equipá-la com instalações modernas.

«Sim, nós vemos renovação, reconstrução e pintura nova no exterior, mas há ainda falta de conteúdo e recursos», diz Al-Allaf.

As instalações estão desatualizadas, faltam livros e equipamentos de informática. Ele diz ainda que é preciso haver treinamento em novos métodos de ensino e uma abordagem mais moderna em relação à administração.

As universidades são espaços internacionais e, segundo Al-Allaf, a de Mossul sofreu por estar isolada.

«Temos capacidade, mas fomos isolados do mundo. Tudo o que precisamos fazer é recuperar o atraso.»

Reconexão

Al-Allaf está tentando restabelecer o contato com a comunidade acadêmica internacional e trabalhando com a equipe da Universidade de Lancaster.

Lancaster ajudou a manter o ensino de linguística em Mossul, oferecendo aconselhamento para alunos e funcionários por meio de videoconferências, orientação para estudantes de doutorado e acesso gratuito a um curso online.

Elena Semino, professora em Lancaster, disse que os acadêmicos da Universidade de Mossul estão «trabalhando em condições que sequer podemos imaginar».

«Os funcionários e os alunos são excepcionalmente empreendedores e entusiasmados. Faremos tudo que for possível para ajudá-los. Eles sabem que estamos torcendo por eles», afirmou.

Há sinais de recuperação nas universidades iraquianas. A Universidade de Bagdá apareceu no ranking global da Times Higher Education, que lista as principais universidades do mundo.

Al-Allaf diz que os acadêmicos no Iraque precisam construir pontes e obter apoio de colegas de outros países.

«Precisamos de apoio acadêmico, e estabelecer vínculos com universidades do mundo todo é essencial», completa.

«A Universidade de Mossul adoraria receber uma mensagem sua, mesmo que seja apenas para dizer ‘oi'».

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