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Praia, sofá e parque: Quem são os eleitores “desiludidos” e porque não vão votar nesta eleição

Cientista político diz que parte da população não se sente representada por partidos políticos.

As eleições se aproximam e um clima de polarização política toma conta de publicações e comentários em redes sociais. Discussões acaloradas sobre política no Facebook, Twitter e WhatsApp desfazem amizades e causam brigas em família. No mesmo cenário, aparecem os desiludidos, que vão anular seu voto ou simplesmente desencanar de tudo e nem aparecer na frente da urna.

Uma delas é a diretora de Recursos Humanos Jane Fernandes, de 37 anos. No próximo domingo, enquanto milhões de pessoas devem sair de casa para votar, ela vai entrar num carro com o marido e a mãe e dirigir de São Paulo para Peruíbe, no litoral paulista. Em entrevista à BBC News Brasil, ela afirma que vai passar o domingo longe das urnas, à beira da praia.

  1. Os obstáculos do voto útil em Ciro ou por vitória de Bolsonaro no 1º turno

«Não sou só eu. O povo brasileiro está desiludido com as opções que temos na política. Eu não tenho partido. Analisei todos os candidatos e não consegui encontrar nada que de fato fizesse com que eu votasse em algum deles», afirmou ela, que vai justificar a ausência.

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Segundo ela, a decisão foi tomada porque ela analisou todos os planos de governo e nenhum é compatível com suas ideias. Santos diz que seu único desejo é que o próximo governo faça uma reforma política no país. Mas ela acredita que nenhum deles implantará a mudança.

«Alguns tem até plano de governo, mas a gente fica descrente porque eles não cumprem nada do que foi prometido. O próprio presidente não consegue colocar seus planos em vigor porque a maior parte é barrado no Congresso», afirmou.

Santos diz que o único candidato que a faria sair de casa para votar no segundo turno é Álvaro Dias (PODE). «Ele é um pouco mais coerente», afirma.

O cientista político e professor da PUC-SP Pedro Fassoni Arruda diz que parte da população tem esse sentimento porque não se sentem representadas por partidos políticos. Segundo ele, essa desconfiança flutua de eleição para eleição e que neste ano as pessoas perderam a confiança no processo eleitoral porque também desconfiam que ele seja desrespeitado.

«Dilma venceu as eleições e teve seu mandato interrompido sem cometer um crime de responsabilidade. Agora, temos um candidato que diz que, caso seja derrotado, não vai reconhecer o resultado das urnas. Além desse elemento que faz as pessoas desconfiar das eleições, temos os boatos de que as urnas não são confiáveis e tudo isso confunde os eleitores», afirmou Arruda.

O que acontece com quem não votar?

O eleitor que não votar nem justificar sua ausência nos prazos determinados pela Justiça Eleitoral deverá pagar uma multa de R$ 3,51 imposta pelo juiz eleitoral por turno.

Se o eleitor deixar de votar em três eleições consecutivas, seu título será cancelado. Caso isso ocorra, não poderá tomar posse em concurso público, tirar passaporte ou carteira de identidade.

Ele também não poderá renovar sua matrícula em estabelecimentos de ensino oficial, obter empréstimos em estabelecimentos de crédito mantidos pelo governo, participar de concorrência e praticar qualquer ato para o qual se exija quitação do serviço militar ou imposto de renda.

A polarização e os desiludidos

De acordo com a última pesquisa Datafolha, apenas 3% dos entrevistados responderam que não votariam em nenhum dos candidatos à Presidência. O cientista político Pedro Fassoni Arruda considera esse número pequeno e cita alguns motivos que explicam esse dado.

«Precisamos pensar que nesta eleição há um grande número de candidaturas, dos mais radicais à esquerda e à direita, passando por candidaturas de centro, centro-direita e centro-esquerda, o que dá ao eleitor uma gama de opções. Esse distanciamento é muito maior em muitos países. Nos EUA, onde o voto não é obrigatório, cerca de de metade da população aparece no dia da votação. Na frança, onde é facultativo, o índice de abstenção também elevado», afirma o professor.

A policial civil Graziela Portal Virno Couto, de 45 anos, disse que não vai sair da casa onde mora em São José dos Campos, no interior de São Paulo, para votar no próximo domingo porque não confia em nenhum político.

«Tudo o que eles contam é mentira. Veja como os hospitais estão um lixo. Meu pai está com câncer e está esperando há um ano ser chamado para fazer tratamento. Minha mãe tem hepatite e fica sem remédio, eu estou há 22 anos na polícia sem receber um aumento. Você acha que eu posso acreditar em alguém?», questiona.

Ela afirma que nem mesmo a candidatura de amigos policiais a faz sair de casa.

«Só estou torcendo para que quem entrar faça alguma coisa que preste. Liberar porte de arma não vai resolver nada. Só investimento em educação vai melhorar o país», afirma.

Na visão da policial, «o Brasil está falido» e se pudesse moraria em Portugal. Ela diz que no país europeu as pessoas são educadas e respeitadas. «Nunca fui para lá. Minha mãe vai muito e diz que é maravilhoso, não tem lixo nas ruas. É um sonho para mim».

Ela afirma que só sairia de casa para votar se estivessem concorrendo Eduardo Campos, Joaquim Barbosa ou Enéas Carneiro.

«Depois ninguém também vai poder vir falar que foi por minha causa mim que o país está uma merda. Depois de um tempo, a gente percebe que tudo o que eles falam é mentira. Quantas vezes o governador Geraldo Alckmin disse que ia dar aumento para polícia? Eu nunca melhoro minha vida porque recebo R$ 4 mil e sou honesta. Mas tem delegacia que sai drogas até pela porta da frente».

Já a manicure Jackeline Santos Ribeiro, de 26 anos, mora em Osasco (Grande São Paulo) e só vai sair de casa no domingo para se exercitar no parque Villa Lobos.

«Não há necessidade de perder meu tempo indo tempo em votar em quem não presta. Tenho coisas melhores para fazer. Muita gente insiste, fala para eu votar em alguém. Eu nem ligo. É como se entrasse num ouvido e saísse pelo outro», afirmou.

Ela disse que seus amigos insistem para que ela se interesse em política, escolha um candidato e vote. «Mas para mim, qualquer um tanto fez, tanto faz», diz.

Ela fala que prefere não acompanhar e que «isso é lorota». Ela afirma ainda que não se preocupa de pagar a multa por não votar ou ter seu título de eleitor cancelado. «Não tenho passaporte e não uso esse documento para mais nada mesmo».

Pressão dos amigos

O repositor de um supermercado no interior de São Paulo Maycon Nogueira Vasconcelos, de 24 anos, estava decidido a sair de casa neste domingo e votar no PT. Mas ele desistiu, depois de muita pressão dos amigos.

«Eu estava decidido a votar no Haddad. Mas meus amigos ficaram me colocando muita pressão, me mandando coisas sobre Lula e corrupção, e eu fui desanimando. Também ficavam me zuando, me chamavam de petista quando me viam no corredor. Insistiram demais para eu votar no Bolsonaro. Nesta segunda-feira, cheguei à conclusão que não vale a pena votar em nenhum dos dois» afirmou.

Vasconcelos estará de folga e não vai sair de casa neste domingo.

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