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“Meu filho caçula pedia para a cachorra nadar”: brasileiros perdem casas nas enchentes e vão para abrigos no Japão

O número de pessoas mortas pelas enchentes no Japão já passa de 150; governo japonês pretende usar cerca de 18 milhões de dólares do fundo de reserva para enviar artigos de primeira necessidade.

O sobrado adquirido na planta dez anos atrás era para ser a moradia permanente do casal de brasileiros Kendia e Kazuo Kuramoto no Japão. O projeto foi feito sob encomenda, com teto alto e sem tatame. Só que o terreno à margem do rio Takahashi no distrito Mabi, em Kurashiki (Okayama), acabou se revelando um pesadelo.

Um fim de semana de chuva torrencial transformou a moradia da família em um amontoado de lama, e quase tudo o que havia nela ficou imprestável. «A água chegou até a metade do segundo andar. Está tudo revirado. Se sobrou algo, foram as poucas coisas que estavam na parte de cima da beliche das crianças», diz Kendia.

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Ela é uma das 8.400 pessoas que ainda se encontram em abrigos indicados pelas autoridades para receber as vítimas das chuvas. «Quando vim para cá, pensava que seria por um pouco tempo», lembra. «Estava com os três filhos em casa quando vi a água muito perto. Peguei as crianças e corremos para cá. Fomos os terceiros a chegar ao abrigo.»

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A família precisou deixar para trás sua cachorrinha, Mel, mas o filho caçula de Kendia fez um apelo ao animal. «Thiago falava para a cachorra nadar se algo de ruim acontecesse, como se animal fosse capaz de entender isso.» Mas foi o que aconteceu. Quando a água invadiu o sobrado dos Kuramoto, a cadela saiu nadando e foi salva por uma voluntária japonesa que passava por lá de jet ski para recolher animais perdidos.

Sem a casa, os Kuramoto precisaram se dividir. A cadela agora fica com um amigo da família. Hugo Matsuura trata do animal, toma conta do filho caçula dos amigos e recebe todos para o banho. Kendia e outra filha permanecem no abrigo, enquanto o filho mais velho dorme na casa de amigos de faculdade e o marido, que é caminhoneiro, passa os dias no serviço.

No mesmo abrigo onde está Kendia, encontra-se outra família de brasileiros que também tiveram a casa tomada pelas água.

Solidariedade

Por um momento, Hugo chegou a pensar que estaria em uma situação de desabrigado, pois também construiu sua casa bem perto do rio. Por sorte, o sobrado fica do lado da cidade de Soja, a parte não alagada.

Quando a chuva começou a engrossar na noite de sexta-feira, pipocaram alertas no celular para que todos se abrigassem em lugares altos. Hugo levou objetos de maior valor para o segundo andar da casa, colocou a família e as cadelas Miki e Kiki no carro e procurou um lugar elevado. Estacionou perto de um supermercado e lá ficaram até manhã do dia seguinte.

Quando voltou, encontrou a casa intacta. A fábrica onde Hugo trabalha produz peças para carros da marca BMW, e fica em uma parte alta do distrito de Mabi. Ela não sofreu danos materias, mas metade de seus funcionários tem faltado para resolver problemas trazidos pelas chuvas. No caso dos doze brasileiros da fábrica, um tem se ausentado por ter perdido o imóvel. Muitos adquiriram a casa própria com financiamento de 35 anos. Para Kendia Kuramoto, restaram 25 anos de pagamento de um imóvel danificado.

Depois da chuva, o calor

As chuvas cessaram e as pesadas nuvens desapareceram dos céus nesta terça-feira na região sudoeste do Japão. Mas para quem mora em uma das quinze províncias castigadas por inundações e deslizamentos resultantes de quatro dias de chuvas torrenciais, a preocupação só se multiplica.

Há o risco do desabastecimento em lojas, além de falta de energia elétrica e água em várias das regiões afetadas pelo desastre. Os termômetros marcaram mais de 30 graus centígrados, e de acordo com a Agência de Meteorologia do Japão, a temperatura deve continuar assim ao longo da semana. Com o calor, o barro trazido das montanhas e pelas águas dos rios acabou endurecendo, dificultando os trabalhos de limpeza.

Equipes de resgate correm contra o tempo, vasculhando vários pontos onde houve inundação e deslizamento para encontrar as cerca de 60 pessoas desaparecidas.

Em Fuchu (Hiroshima), em vez de trégua, as águas barrentas do rio Enoki atingiram com força uma parte da cidade nesta terça-feira, fazendo novas vítimas. O número de mortos só aumenta, e tinha ultrapassado a marca de 150 em todo o Japão no final da tarde de terça-feira (horário local).

A distribuição de mantimentos e produtos para as áreas mais afetadas está prejudicada devido à suspensão das operações dos trens de carga entre a região metropolitana de Tóquio e o oeste do Japão.

O governo japonês pretende usar cerca de 18 milhões de dólares do fundo de reserva para enviar artigos de primeira necessidade. Para resolver o problema de escassez de produtos, também serão designados alguns veículos para transporte emergencial.

O Ministério da Agricultura do Japão estima em mais de 23 milhões de dólares os prejuízos na agricultura.

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