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Milhões de brasileiros sofrem com falta de água tratada e esgoto

No Brasil, 34 milhões de pessoas – cerca de 16% da população – não têm acesso a água potável; 100 milhões (43%) nem sequer têm o esgoto coletado, e o índice de tratamento de dejetos é de apenas 44,9%. A denúncia foi entregue pessoalmente ontem ao relator especial da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre saneamento básico, Leo Heller, durante o 8º Fórum Mundial da Água.

O relatório é assinado pelas organizações Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), Artigo 19, Instituto Ethos e Conectas, e traz dados do Ministério das Cidades que mostram como o saneamento básico, apesar de ser considerado um direito humano pelas Nações Unidas, ainda está longe de ser uma realidade para todos os brasileiros.

O relator da ONU, Leo Heller, afirmou que analisará o estudo em profundidade e que considera  a iniciativa “oportuna e necessária” no momento atual.

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Retrocessos

Conforme aponta o relatório, o acesso ao saneamento básico está diretamente ligado às desigualdades regionais. Enquanto no Sudeste, por exemplo, o acesso à água potável chega a 91,24% da população, no Norte este percentual é de 55,37% (leia ao lado).

O estudo também lança luz sobre a falta de investimentos na área. Em seis anos, a queda em repasses para o setor chegou a 45%. Se, em 2012, foram investidos R$ 2,9 bilhões no setor, para este ano a previsão é de R$ 1,6 bilhão.

Embora o Plano Nacional de Saneamento Básico  determine a universalização do serviço no país até 2033, neste ritmo, conforme aponta o estudo, essa meta só será alcançada em 2054, na melhor das hipóteses.

Marco regulatório

Na segunda, durante a abertura oficial do Fórum Mundial da Água, o presidente Michel Temer afirmou que trabalha para aprovar um novo marco regulatório do saneamento básico. O projeto pretende rever a legislação da área e atrair mais investimentos.

Resoluções naturais

Se no Brasil os dados são alarmantes, no mundo a realidade não é tão diferente. Cerca de 1,9 bilhão de pessoas no planeta vivem em áreas de escassez severa de água. Estima-se que em 2050, o número aumente para 3 bilhões, de acordo com o relatório da ONU, divulgado pela diretora-geral da Unesco, Audrey Azoulay, e o diretor do UN Water, Gilbert Houngbo.

Mas o documento não aponta só problemas. Consta no relatório que os canais de irrigação e estações de tratamento de esgotos, por exemplo, não são os únicos métodos de gestão da água. A saída para essa crise está no próprio meio ambiente e já tem nome: o termo Soluções baseadas na Natureza (SbN) foi criado pela IUCN (União Internacional para Conservação da Natureza), em 2009.

Para Renato Atanazio, coordenador de Soluções Baseadas na Natureza da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza,  fora do Brasil é o termo já é bastante conhecido, enquanto por aqui ainda está começando a ganhar força. Desde o fim de 2017, a Fundação está desenvolvendo estudos com outras organizações renomadas para avaliar de quais formas a natureza consegue resolver essas questões.

Um dos projetos começou no início do mesmo ano e se destinou para o Sistema Cantareira (conjunto de represas responsável pelo abastecimento de quase 9 milhões de pessoas na Região Metropolitana de São Paulo). Os problemas identificados foram as consequências do desmatamento nas áreas de mananciais, responsável pela formação de sedimentos que poluem o abastecimento hídrico.

É fundamental limpar essa água, mas os custos de produtos químicos e energia envolvidos são altos. A solução, então, foi recuperar as florestas nesse território, fazendo reduzir a erosão do solo e os sedimentos que chegam nas barragens. De acordo com a WRI, no final de 2017, os benefícios superaram os custos em até 16,54%, sem contar os fatores ecológicos. “[O projeto] evidencia que vale a pena conservar a natureza pelo retorno econômico”, diz Atanazio.

Entre o cinza e o verde

As construções baseadas na engenharia tradicional, que  causam alagamentos e poluição, são chamadas de infraestruturas cinzas. Enquanto as soluções baseadas na natureza são consideradas verdes. Mas essa diferença não significa que elas são rivais ou divergentes.

Lícia Azevedo, coordenadora de projetos da organização ambiental The Nature Conservancy, analisa que as verdes auxiliam no processo de segurança hídrica, mas sem descartar as tradicionais, ou cinzas, que, para ela, continuam sendo o único meio para conter situações emergenciais, como a crise de abastecimento. 

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