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Quase dois anos após tragédia de Mariana, Samarco pagou apenas 1,5% das multas

Tragédia em Mariana Rogério Alves/TV Senado

Junto com a lama da barragem de Fundão, que se rompeu em novembro de 2015 em Mariana, Minas Gerais, uma enxurrada de multas, ações e processos também inundou os tribunais e órgãos de fiscalização brasileiros. Desde cobranças pelos danos ao meio ambiente, até a responsabilidade pelas 19 mortes causadas, a mineradora Samarco acumula dezenas de processos que não se desenrolam e seguem sem perspectivas de desfecho em curto prazo.

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Passados dois anos, a maioria das multas impostas pelos órgãos ambientais sequer foi paga e a ação criminal do rompimento está suspensa, sem previsão de ser retomada.

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Levantamento do Metro Jornal junto aos governos federal, de Minas e Espírito Santo apontou que 70 penalidades foram aplicadas à Samarco. Porém, 68 estão em fase de recurso. Juntas, elas representam uma verdadeira ‘montanha’ de dinheiro em infrações. As únicas pagas até agora foram a autuação realizada pelo CIF (Comitê Interfederativo), no valor de R$ 5,9 milhões, e a multa da Semad (Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais), de R$127 milhões, mas que foi parcelada em 59 vezes – só a primeira prestação foi quitada.

Sozinho, o Ibama anotou 24 multas à mineradora, sendo cinco delas no valor de R$ 50 milhões cada – cobrança máxima prevista na legislação. Para o biólogo e consultor na área de recursos hídricos, Ricardo Motta Pinto Coelho, a tragédia evidenciou o que já era de conhecimento para muitos: a morosidade da Justiça e a falta de preparo dos órgãos ambientais. “Tenho convicção de que nossas instituições não estavam preparadas para isso e ainda não estão”, afirma Ricardo.

Em meio a tantos problemas, o ambientalista faz algumas observações positivas em relação aos dois anos da tragédia, como a assinatura do TTAC (Termo de Transação de Ajustamento de Conduta) com o MPF para reparar os danos ambientais e a criação do CIF, que orienta os atos da Fundação Renova para gerir e executar as medidas de recuperação dos danos. Porém, ele destaca que enquanto o setor econômico continuar ditando as regras do jogo, o meio ambiente continuará em perigo. “Em 2015 foi Mariana, mas desde aquele dia, outras tragédias continuaram a acontecer, sempre em favor dos meios de produção, do lucro a qualquer custo e com uma fiscalização frágil. Precisamos de uma revolução muito grande para mostrar que realmente aprendemos a lição”.

Outro lado – Multas devem ser reavaliadas, diz Samarco

Em nota, a Samarco afirma que recorre das multas por entender que “há aspectos técnicos e jurídicos nas decisões que precisam ser reavaliados”. A empresa alega ainda que desde novembro de 2015 até agosto deste ano foram desembolsados R$ 2,5 bilhões nas ações de reparação e compensação assumidas em um Termo de Transação de Ajustamento de Conduta (TTAC), firmado em 2016 com os governos federal, de Minas Gerais e do Espírito Santo. As atividades da empresa ainda continuam suspensas por falta de alvarás.

21 denunciados – Ação criminal está parada

Em novembro de 2016, o MPF (Ministério Público Federal) denunciou 21 pessoas por homicídio qualificado com dolo eventual em um processo criminal que investiga as 19 mortes ocorridas no desastre. Entre os acusados, estavam o presidente afastado da Samarco, Ricardo Vescovi, e o diretor de operações e infraestrutura da mineradora, Kléber Terra. O processo, no entanto, foi suspenso em julho de 2017, depois que a dupla alegou ilegalidade no período autorizado para a quebra do sigilo telefônico. No último dia 11, o órgão pediu à Justiça a retomada do processo com a justificativa de que não foi constatada a utilização de nenhum monitoramento telefônico feito sem ordem judicial. A Justiça Federal ainda não se manifestou.

OAB alerta que vítimas podem ficar sem indenização

Mesmo depois de dois anos, o processo de indenização às vítimas ainda não foi concluído. Segundo a presidente da Comissão de Direito Ambiental da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Cíntia Ribeiro de Freitas, com exceção dos familiares das pessoas que morreram, ninguém foi indenizado até agora. Para piorar, grande parte corre o risco de não receber o que imagina caso o processo não seja finalizado até novembro do ano que vem.

“A reparação de danos individuais prescreve em novembro de 2018. Com isso, famílias e milhares de atingidos pelo rompimento da barragem podem ficar sem receber devidamente as indenizações financeiras pelos danos morais e materiais, restando apenas a opção de um pagamento geral para todos os atingidos, o que é um absurdo. Sabemos que em meio a tudo isso, existem pessoas que perderam muito mais que suas casas, mas também suas histórias, suas lembranças. Não podemos apenas juntar tudo em uma ação e pagar todos por igual”, alerta Cíntia.

Segundo o promotor de Justiça Guilherme de Sá Meneghin, há, apenas na comarca de Mariana, 16 ações coletivas e duas criminais. “Foram se acumulando desde o rompimento da barragem. No geral, temos uma avaliação negativa, principalmente da Samarco, por não ter cumprido com tudo o que foi acordado. Há famílias que estão todo esse tempo sem receber nenhum auxílio emergencial e vários equívocos foram cometidos nos projetos de reassentamento”, argumenta.

A Fundação Renova afirma que desde o primeiro dia após o rompimento da barragem de Fundão, foram desembolsados R$ 500 milhões em indenizações. A expectativa da Renova é que até meados de 2018 todas elas estejam concluídas.

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