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Painel instalado na UFMG retrata cortes na educação

Silvana Sá/Adufrj

No microorganismo que produz o iogurte, no celular, nos remédios que curam doenças e nas pesquisas que buscam formas mais eficazes de tratamento. A ciência está em todos os cantos. Mas para que ela aconteça, é preciso de dinheiro. E com cortes cada vez mais profundos, como manter a produção científica brasileira viva? Desde 2015, o MCTIC (Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações) e as universidades federais já perderam quase R$ 11,5 bilhões em seu orçamento, o que representa R$ 500 mil por hora ou R$ 8 mil por minuto.

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Os efeitos dessa redução são laboratórios em condições precárias, onde faltam até água e luz, paralisação de estudos, como o que promete aumentar os nutrientes do arroz e do feijão ou os que apontem para a cura do Alzheimer e do mal de Parkinson, além de redução de bolsas de estudo. E para alertar sobre a dimensão dos cortes, a UFMG recebeu ontem um ‘tesourômetro’ – placar que contabiliza o que a ciência e a educação superior já deixou de receber no Brasil. A iniciativa é do Conhecimento Sem Cortes.

Para a presidente do movimento, Tatiana Rocha, o orçamento menor traz impactos para toda a sociedade. “Tudo isso é consequência de um ajuste fiscal perverso, com a criação de uma PEC que limita a correção dos gastos públicos ao percentual da inflação. A única solução é reverter isso”, argumentou.

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A largada do movimento foi dada no Rio de Janeiro e a previsão é que mais um placar seja instalado em Brasília. “Ele mostra os cortes em tempo real. Já temos várias pesquisas impactadas pela falta de dinheiro, como a que desenvolve uma vacina contra o zika vírus, e ainda a formação de professores”, apontou. Além de sensibilizar a população, o movimento tem o objetivo de reunir 20 mil assinaturas para exigir o fim dos cortes, a continuidade de políticas de inclusão nas universidades e a retirada da Saúde e da Educação no teto de gastos.

‘Quase colapso’

O diretor do Apubh (Sindicato dos Professores das Universidades Federais de Belo Horizonte, Montes Claros e Ouro Branco), Giovane Azevedo, sintetizou que a situação é de “quase colapso” no orçamento das instituições públicas. “Na UFMG, por exemplo, já podemos identificar os cortes em bolsas de graduação, pós e iniciação científica, demissão de terceirizados, o que impacta na segurança e manutenção dos campi, além da redução na assistência estudantil. Outros reflexos serão sentidos no longo prazo, como menos investimentos nos cursos, redução de vagas e evasão escolar constante”, disse.

Na Universidade, as obras de reforma e ampliação das unidades foram paralisadas há quase dois anos. “Praticamente todos os contratos ligados à construção civil foram encerrados. E as oportunidades de intercâmbio de estudantes estão praticamente estagnadas”, contou. De acordo com o dirigente, a preocupação atual é com os laboratórios que demandam mais verba. “São os que precisam de temperaturas muito baixas para manter os estudos ou mesmo alguns que funcionam 24 horas. Ainda não estão sendo afetados, mas eles nos preocupam”, finalizou.

Em nota, o MCTIC disse que “reconhece e respeita a livre manifestação da comunidade acadêmica e científica, porém, não corrobora os valores apresentados”. A pasta alegou ainda que “está dando prioridade a seus institutos (16 unidades de pesquisa e as 6 organizações sociais)” e que “trabalha pela recomposição orçamentária, atuando junto aos Ministérios da Fazenda e do Planejamento”.

Ciência sem regulamentação

Para reduzir a burocracia e ampliar os investimentos em pesquisa e tecnologia no país, a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) sancionou no ano passado o Novo Marco Legal de Ciência, Tecnologia e Inovação. E para que o texto entre em vigor, é necessária a sua regulamentação. Em abril, o MCTIC recebeu as propostas de padronização da comunidade científica, das universidades e do setor produtivo.

“No Brasil temos uma dicotomia histórica entre público e privado. Somos marcados pelo patrimonialismo, que acabou por tornar a relação entre esses setores promíscua. O que está sendo proposto é o estabelecimento de regras claras, com objetivos definidos”, declarou o Procurador-Chefe do  CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), Leopoldo Gomes.

A nova lei prevê alianças estratégicas e desenvolvimento de projetos de cooperação entre instituições de pesquisa, empresas e entidades sem fins lucrativos para a geração de produtos, processos e serviços inovadores e a transferência e difusão de tecnologia. A aplicação, porém, tem encontrado barreiras. “Há um desconhecimento grande das instituições sobre o marco legal, o que ele permite ou não”, pontuou o professor da UFMG, Ricardo Gazzinelli. 

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