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Menos cabelo, mais vergonha na cara

Cresci ouvindo que o Brasil tinha tudo, desde ouro, minérios, pedras preciosas, amplas extensões territoriais, rios, enormes lagos, acesso ao mar e uma infinidade de coisas que poderiam fazer de nosso país uma potência mundial. Esse era o discurso de nossos pais quando orgulhosos vislumbravam “o país do futuro” profetizado por Stefan Zweig. O futuro chegou e, em relação a alguns valores, o passado parece mais avançado, mais respeitoso. O fato é que de nada adianta ter tudo isso e não ter o essencial: vergonha na cara. E isso, infelizmente, falta para muitos brasileiros e se reflete, sobretudo, na política. Exemplos negativos existem aos borbotões nas sedes dos governos, de Porto Alegre a Brasília.
Na semana passada, o presidente do Senado, Renan Calheiro (PMDB-AL), usou novamente um jatinho da FAB (Força Aérea Brasileira) para compromissos particulares. Desta vez foi de Brasília a Recife para uma cirurgia estética de implantação de 10.000 fios de cabelo no couro cabeludo. Agora, diante do vazamento na imprensa, enviou consulta ao comandante da Aeronáutica, brigadeiro Juniti Saito, para saber se houve irregularidade. Por meio da assessoria, ele sustenta que se a viagem for considerada fora do que prevê o decreto que dita as regras para uso oficial de aeronaves por autoridades, devolverá o dinheiro. Trata-se de um ator que se supera, diante de uma plateia que mais parece boiada, sem reagir aos desmandos da corte. É um craque na arte de contar histórias, tergiversar, enrolar o contribuinte.

Não por acaso Lula fez de tudo para que Renan fosse salvo da perda do mandato em 2007, quando se descobriu que a amante recebia mesada vultosa de uma empreiteira com interesses no governo. No caso do uso de jatinhos, o homem é reincidente. Em junho deste ano, foi a Trancoso, na Bahia, para o casamento da filha de um senador amigo. Que festa! Depois, acuado pela publicidade do fato na imprensa, reembolsou R$ 32 mil à União. E assim vamos assistindo a esta dramaturgia política de quinta categoria.
O cidadão Renan Calheiros tem o direito de fazer implante capilar. Já o presidente do Senado tem o dever de respeitar o dinheiro dos brasileiros, mesmo que para ele seja troco. Vergonha deixa a cara mais limpa e vale mais que milhares de fios de cabelo novos. O Brasil do futuro agradece.

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