«Eu não praticava exercícios. Eu fazia de vez em quando alguma coisa, uma caminhada, mas nada regular. E o meu médico, depois que eu tive o diagnóstico do câncer, falou do quão importante é o exercício físico», diz a professora de Artes Plásticas Cristiane Daud, de 55 anos, atualmente curada de um tumor de mama. «Hoje faço bastante academia, natação e musculação, até de fim de semana.»
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O Ministério da Saúde apresenta nesta sexta-feira, 19, um estudo inédito no País que indica que cerca de 12% das mortes de mulheres por câncer de mama poderiam ser evitadas pela prática regular de atividade física (150 minutos por semana). A pesquisa ainda liga outros hábitos à ampliação do risco, como o uso abusivo de álcool e dietas com excesso de açúcar.
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Os dados foram divulgados no artigo científico Mortality and years of life lost due to breast cancer attributable to physical inactivity in the Brazilian female population (1990-2015), publicado online pela revista Nature neste ano. O levantamento de informações teve apoio do governo brasileiro e concluiu que 2 075 mortes poderiam ter sido evitadas, apenas no ano de 2015, se as pacientes realizassem ao menos uma caminhada de 30 minutos por dia, cinco vezes por semana.
Conforme o estudo, com apoio do Instituto de Métricas de Washington (EUA) e recursos da Fundação Bill & Melinda Gates, a atividade física diminui o estradiol e aumenta a globulina de ligação. Nesse processo, há redução de situações inflamatórias. «Atividade consome hormônios que sobrecarregam as glândulas mamárias», explica Fatima Marinho, diretora do Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção da Saúde da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde. Ela é uma das autoras, ao lado de Diego Augusto Santos Silva, Mark Stephen Tremblay, Maximiliano Ribeiro Guerra, Meghan Mooney, Mohsen Naghavi e Deborah Carvalho Malta.
Duas em cada três
O problema é maior nas principais capitais e afeta duas em cada três mulheres. Ali, 13,9% delas admitem ser totalmente sedentárias, segundo a pesquisa governamental Vigitel 2017. E 51,3% praticam atividade física insuficiente – ou seja, não alcançam os 150 minutos semanais de atividades de intensidade moderada ou 75 minutos semanais de atividades de intensidade vigorosa. «Trata-se de uma questão evolutiva. Nos primórdios, correr, andar muito, era uma questão de sobrevivência. Hoje, para onde se vai, se senta. É um risco que fica bem claro», diz a pesquisadora.
Para Edison Mantovani, coordenador do Departamento de Mastologia do Instituto Brasileiro de Controle do Câncer (IBCC), é importante observar que os casos de câncer de mama entre mulheres estão mais ligados à faixa etária pós-menopausa. É quando o desenvolvimento dos tumores deixa de estar ligado aos ovários e passa a ter relação com o tecido gorduroso. Nesse momento, devem ser incentivados os exercícios físicos. «E não é apenas caminhar. É atividade que queime gordura, que resulte em redução de peso.»
Estados brasileiros com melhores indicadores socioeconômicos apresentaram as maiores taxas de óbitos de câncer de mama atribuível à inatividade física – pela ordem, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo. «Apesar de não aparecerem na lista, o Norte e o Nordeste também estão passando por uma transição de mortalidade, ou seja, aumentando o número de óbitos por doenças crônicas», afirma a diretora do Ministério da Saúde. «Na Amazônia, por exemplo, observamos que as pessoas estão deixando de comer açaí e mandioca no café da manhã, trocando por pão branco. Produtos industrializados estão tomando o lugar do peixe», exemplifica Fátima.
O trabalho ainda indica que outros 6,5% de mortes poderiam ser evitados com controle de peso, dieta reduzida em açúcares e controle do consumo de álcool. Ainda faltaria, como aponta Mantovani, investigar melhor as correlações entre os demais fatores de risco. O estudo ainda não leva em consideração os diferentes tipos de tumor e as possibilidades de tratamento. «O mais importante, para redução da mortalidade, continua a ser o diagnóstico precoce.» E faltaria considerar elementos do dia a dia (químicas e radiação, por exemplo) e história genética do paciente.
Metas
O Ministério da Saúde afirma que já adotou metas internacionais contra o sedentarismo, incluindo deter o crescimento da obesidade na população adulta até 2019, reduzir o consumo regular de refrigerante e suco artificial em pelo menos 30% na população adulta e ampliar em no mínimo 17,8% o porcentual de adultos que consomem frutas e hortaliças regularmente até o mesmo ano.
Também destacou que desde 2011 envia recursos para municípios instalarem academias públicas, o que teria resultado na criação de 3,8 mil polos habilitados. «E estamos incentivando nos polos de promoção da saúde dos municípios que o exercício físico integre as consultas regulares. Às vezes, as pessoas precisariam ir aos consultórios só para se exercitar», diz a diretora.
Adesão
A prática regular de atividades físicas contribui não só na prevenção como na adesão ao tratamento de pacientes diagnosticados com câncer de mama. Submetidas a terapias agressivas, mulheres com tumores podem ter uma série de efeitos colaterais. «A atividade física ajuda na fadiga oncológica, no controle da dor, nos transtornos de humor e distúrbios de sono», explica Christina May Moran de Brito, chefe do serviço de reabilitação do Instituto do Câncer de São Paulo. Há ainda ganhos psicossociais. «É um ciclo virtuoso: quem faz exercício tende a se alimentar melhor, dormir melhor e se expor menos a hábitos nocivos.»
«Essa é a parte do tratamento que está nas mãos do paciente», diz Heloísa Veasey Rodrigues, oncologista do Hospital Albert Einstein. Para ela, é compreensível que os piores indicadores da associação entre sedentarismo e câncer de mama estejam nos Estados mais ricos. «Nosso estilo de vida moderno não favorece a prática de atividade física de maneira regular», diz. «Mas há medidas que podem ajudar, como descer no ponto de ônibus antes do que o de costume, subir escadas se você trabalha em prédio», exemplifica.
Presidente da Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM), Antônio Frasson destaca os benefícios da prática esportiva, mas alerta para o acesso a exames. Estudo da SBM com a Rede Brasileira de Pesquisa em Mastologia mostrou que a cobertura mamográfica no País em 2017 foi de 24,1%, abaixo dos 70% recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS). «As pessoas têm dificuldades, as filas são longas», diz.