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Nova Graphic MSP, ‘Tina – Respeito’ discute o assédio sofrido pelas mulheres

Reprodução

Aos 22 anos, Tina realiza um de seus maiores sonhos, que é ir trabalhar em uma redação e poder exercer uma das coisas que mais ama: o jornalismo. Mas essa alegria começa a desvanecer quando passa a ser assediada por quem deveria estar ao seu lado para apoiá-la.

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Um tema infelizmente comum, mas que precisa ser falado, é a história da vigésima quarta edição da Graphic MSP, em “Tina – Respeito”, desenhada e escrita por Fefê Torquato para a série criada pela Mauricio de Sousa Produções.

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De menina hippie, a jovem foi redesenhada por Fefê como uma mulher que sofre a normal insegurança do começo de uma carreira profissional, mas que ao mesmo tempo mostra determinação para fazer o melhor.

Porém, sua dedicação profissional passa a não ser prioridade em sua vida, quando as diversas formas de assédio aparecem no dia a dia e tomam conta de seus pensamentos, seja na rua, no mercado, ou no ônibus – quantas mulheres não passaram pela situação ilustrada por Fefê, de um ônibus vazio, e um homem escolhe sentar justamente ao lado de uma mulher sozinha?

capa tina respeito

Em “Respeito”, a autora coloca o leitor dentro da vida de Tina, em sua casa, com os amigos, no trabalho, criando uma empatia fundamental para entender que, o que a personagem passa, é mais comum do que muitos pensam. Que “uma cantada fora de contexto é uma forma de assédio”, ressalta a ilustradora.

E, quando Tina passa a ser resistente à situações inconvenientes e descabidas, ela mostra todo seu potencial de luta, sabendo que seu movimento é fundamental para que ela e outras mulheres sejam efetivamente respeitadas.

Aquarela

Além do ótimo roteiro, é importante também citar a arte de Fefê Torquato, que traz a beleza e leveza de seu trabalho à história, com traço e a finalização em aquarela e lápis de cor. Todo o processo de criação é detalhado no fim do livro, junto de outras informações que deixam a “Tina – Respeito” ainda mais completa.

Pipa & Rolo

A trama é centrada em Tina, mas claro que não poderiam faltar personagens importantes de sua história, como os amigos Pipa e Rolo, fundamentais nesse momento difícil que a protagonista passa.

pipa e rolo da ha 'Tina'

A primeira
Tina apareceu pela primeira vez em 15 de fevereiro de 1970, na capa da “Folhinha de S.Paulo”, de um jeito bem hippie. Sua primeira tirinha protagonista veio dois anos depois

primeira aparição de Tina

Fefê Torquato

A desenhista e escritora começou sua carreira em 2011, como ilustradora. Três anos depois criou a webcomic “Gata Garota”, que teve seu primeiro volume publicado pela Editora Nemo. Em 2016 lançou dois projetos independentes, “Estranhos” e “A”.

fefe torquato

Veja a conversa da quadrinista com o Metro Jornal:

1. Quando você recebeu o convite para desenhar Tina, como surgiu a proposta de cuidar do roteiro também? O tema foi sugerido por você ou a temática sobre assédio no trabalho já era pré-estabelecida? Era um período que você estava longe de quadrinhos, certo?
Eu recebi o convite através de uma ligação do Sidney em agosto de 2018. Ele conhecia meu trabalho com «Gata Garota», e «Estranhos», que são meus quadrinhos de 2015-2016 ainda feitos digitalmente em preto e branco, mas não o meu trabalho com aquarela. Indicado pelo Vitor Cafaggi, ele decidiu dar uma olhada no meu Instagram e gostou muito. À princípio ele me procurou para fazer a arte e perguntou se eu tinha interesse em fazer o roteiro também. Já que não produzia nenhum quadrinho novo em dois anos, disse que com certeza. Coincidentemente eu já estava planejando voltar a fazer quadrinhos usando aquarela nessa época.

Então o Sidney me pediu para mandar uma sinopse inicial naquela semana para ele confirmar. O tema já estava estabelecido, assédio. Eu fiz uma história inicial, que ainda é a base da história final, e alguns esboços iniciais da Tina, Pipa e Rolo, que estão nos extras do livro. Ele aprovou e aqui estamos nós!

2. Como foi o desenvolvimento do roteiro?
Eu procurei saber quem era, afinal, a Tina. Do grupinho a minha preferida sempre foi a Pipa. Então fui atrás da origem da personagem até os tempos de hoje, toda a sua evolução e personalidade. E como contar uma história sobre assédio, um tema tão forte, de maneira direta porém também leve. A história em si não é baseada em nenhum fato verídico. Mas não há uma mulher que não tenha vivido assédio pelo menos uma vez na vida e eu não sou exceção. Não foi difícil criar uma história e por ali as vivências de todas nós, com todos os cuidados que tomamos no dia a dia que nem percebemos mais. Meu exercício maior foi justamente parar para pensar nesse hábitos e experiências. E ficar chocada com o quanto tudo isso toma o nosso tempo e energia.

Quanto ao assédio que a Tina vive no ambiente de trabalho, gostaria de dizer que é mais raro, mas não é. Muito pelo contrário, é extremamente comum. Apesar de que felizmente nunca aconteceu comigo, não preciso ir longe pra poder criar todos os diálogos, imaginar as intimidações, descrédito, gaslighting e chantagens. São muitos exemplos e vivências de falta de respeito que nós mulheres colecionamos durante a vida que uma história dessas não se inventa mais, só se revive constantemente.

3. Como era a relação com a Graphic MSP? Você incluiu (que bom!) Pipa e Rolo na história… houveram restrições em relação aos personagens, como traços e personalidades, ou a liberdade foi total para criar?
Eu acompanho esse selo desde o começo, foi um grande marco no mercado de quadrinhos. O sonho de muitos quadrinistas independentes era receber o convite do Sidão. Mas sinceramente achei que jamais receberia. Então às vezes acho meio surreal, voltar a fazer quadrinhos em tão alto estilo! Haha! Eles me deram bastante liberdade quanto aos personagens, que não poderiam ser os protagonistas da história, que é só da Tina, mas claro que deveriam aparecer. E criar a cena deles interagindo foi muito natural, quase se escreveu sozinha. Eles são mesmo amigos de verdade e acho que o pouco que aparecem conseguem transparecer isso muito bem.

4. Quanto tempo levou para criar Tina – Respeito, desde o convite até a impressão do trabalho?
Eu entreguei em cima da hora, no último dos prazos. Não tanto porque o quadrinho me deu trabalho, mas por muitos imprevistos pessoais que aconteceram nesse meio tempo atrasaram todo o processo. Posso dizer que se pensar nos dias que trabalhei no roteiro, rascunhos e finalização, o quadrinho foi feito em seis meses.

5. Qual a sua visão da história da Tina dentro da Turma da Mônica ao longo desses anos?
A Tina foi uma das únicas, senão a única, personagens que mudou conforme os tempos. Então ela tem essa capacidade, e missão até acho, de se comunicar com a sua época. Hoje ela não é mais uma adolescente, por isso pode se comunicar bem com as novas gerações discutindo temas mais sérios e contemporâneos. E também por ser uma jornalista ela pode fazer muito bem esse papel de questionadora.

6. Como você tem sentido o impacto dessa obra? Você recebe o retorno de leitoras?
É uma sensação conflitante, feliz com o grande retorno positivo, mas triste em ver a quantidade de mulheres que se identificam com a história. Tento pensar que é mais positivo porque dá voz a uma situação que nós silenciamos por muito tempo.

A mensagem que eu tentei passar com a HQ, e acho que está sendo bem compreendida pelas pessoas, foi a força que o grupo tem quando se une. A força que as personagens se dão, a confiança que dividem, o quanto se escutam e se abrem. E aos leitores homens que não passam por essas situações, o livro é uma importante ferramenta pra exercitar a empatia, que é o que eles mais precisam desenvolver.

7. O que tem de você em Tina e o que Tina trouxe de novo para sua vida?
Acho que emprestei um pouco do meu humor pra ela, que é uma coisa que eu sempre busco trazer nas minhas histórias, humor acima de tudo. A Tina me fez sair um pouquinho da minha casca. Entrar em contato com as pessoas, compartilhar mais. Definitivamente a Tina se tornou um grande marco da minha vida e carreira.

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