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Laurentino Gomes lança livro sobre a história da escravidão no Brasil

Na manhã do dia 8 de agosto de 1444, em Lagos, sul de Portugal, acontecia o primeiro leilão de cativos africanos registrado na história. O acontecimento é o ponto de partida de “Escravidão: do primeiro leilão de cativos em Portugal até a morte de Zumbi dos Palmares”, primeiro volume de uma trilogia dedicada à história do escravidão no Brasil, escrita pelo jornalista Laurentino Gomes.

A obra, que reúne ensaios e reportagens de campo que abrangem um período de 250 anos da história brasileira, foi lançada na Bienal Internacional do Livro do Rio de Janeiro. O autor segue, agora, em uma turnê de lançamentos ao redor do Brasil.

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Foram seis anos de trabalho, que compilam duas centenas de livros lidos e viagens a 12 países como parte do minucioso processo de criação da trilogia. No Brasil, alguns dos lugares visitados pelo escritor foram o Cais do Valongo, no Rio de Janeiro, o maior porto de desembarque de escravos no século 19; a Serra da Barriga, em Alagoas, onde morreu Zumbi dos Palmares em 1695; fazendas dos barões do café no Vale do Paraíba, em São Paulo; e antigos engenhos e quilombos no Nordeste.

A África – principal foco do primeiro volume da trilogia – fez parte do roteiro de Laurentino, uma vez que, segundo ele próprio, “para falar de escravidão no Brasil, é preciso começar pela África”. Foram cinco viagens a oito países do continente: Cabo Verde, Senegal, Angola, Gana, Benin, Marrocos, Moçambique e África do Sul. Esses lugares aparecem, no livro, como cenário onde aconteciam as incursões portuguesas para captura de escravos.

“Pesquisar e escrever sobre a escravidão foi uma experiência emocional impactante e profunda”, disse o escritor ao Metro Jornal. Essa parte da história do país teve, de acordo com o autor, consequências visíveis até a contemporaneidade.

“O Brasil foi construído com trabalho cativo, primeiro indígena, depois africano. Isso deu o alicerce para a colonização portuguesa na América e a ocupação do imenso território. Também moldou a maneira como nos relacionamos uns com os outros ainda hoje”, afirma.

Os dois próximos volumes serão publicados em 2020 e 2021. As obras serão dedicadas ao auge do tráfico negreiro, ao movimento abolicionista e ao fim da escravidão.

Outra trilogia

Seis vezes ganhador do Prêmio Jabuti de Literatura, Laurentino Gomes é autor de outra trilogia sobre a história do Brasil. Ela é composta pelos livros “1808”, sobre a fuga da corte portuguesa de dom João para o Rio de Janeiro; “1822”, sobre a Independência do Brasil; e “1889”, sobre a Proclamação da República.

Confira mais da conversa de Laurentino Gomes com o Metro Jornal:

Quais consequências a escravidão deixou para o Brasil atual?

Neste início de século 21, temos uma sociedade rica do ponto de vista cultural, diversificada e multifacetada, mas também marcada por grande desigualdade social e manifestações quase diárias de preconceito racial. Isso, no meu entender, é ainda herança da exploração desumana, cruel e indigna do trabalho de milhões de pessoas forçadas a cruzar o oceano Atlântico a bordo dos navios negreiros para viver como cativas no Brasil colônia.

Portanto, o legado da escravidão persiste entre nós ainda hoje na forma de preconceito, exclusão social, ou, pior, de autonegação, como se o tema não existisse ou não merecesse ser estudado. Os descendentes de africanos ganham menos, moram em lugares mais insalubres, estão mais expostos aos efeitos da violência e da criminalidade. Espero dar uma contribuição pessoal para o desafio brasileiro de encarar a sua própria história escravagista e dela tirar lições que nos ajudem a construir o futuro.

Por que escolheu escrever sobre esse tema?

Foi uma decorrência natural da minha primeira trilogia de livros. Estudar 1808, 1822 e 1889, ou seja, as três datas fundamentais para a construção do Brasil como nação independente no século 19, ajuda a explicar a maneira como nos constituímos do ponto de vista legal, institucional e burocrático. Mas não é o suficiente para entender os aspectos mais profundos da nossa identidade nacional. Para isso, é preciso ir além da superfície, observar a história dos índios, dos negros e como a sociedade e a cultura brasileiras foram se moldando desde a chegada de Pedro Álvares Cabral na Bahia até os dias de hoje. Ao fazer isso, eu me dei conta de que o assunto mais importante da nossa história não são os ciclos econômicos, as revoluções, o império ou a monarquia. É a escravidão.

Quais foram os personagens mais marcantes dos 250 anos abordados?

No livro, existem personagens fortes e acontecimentos que certamente vão surpreender os leitores. É o caso do rei do Mali (um dos grandes impérios africanos), que dois séculos antes de Vasco da Gama e Pedro Álvares Cabral tentou chegar ao Brasil atravessando o Atlântico numa flotilha improvisada de canoas. Ou da rainha africana Jinga, que comandou milhares de guerreiros homens, infernizou a vida dos portugueses em Angola no século 17, e hoje é uma heroína do movimento comunista que fez a libertação do país, na década de 70. Histórias como essa ajudam a jogar luz, atrair e reter a atenção dos leitores para um assunto com o qual todos nós, brasileiros, deveríamos nos preocupar.

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