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Em O Assassinato do Comendador, Murakami explora prosa mais solta em novo livro

Aos 69 anos e com uma trajetória literária que se mantém sólida há quatro décadas, com vendas na casa dos milhões em 50 idiomas diferentes, o escritor japonês Haruki Murakami não parece preocupado em se provar para ninguém. Ao menos é essa a sensação que se tem com “O Assassinato do Comendador”, seu 14º romance, publicado no Brasil em dois volumes (o segundo ainda sem previsão de lançamento).

Aqui, o narrador – um pintor de retratos comerciais na casa dos 30 anos – vê seu casamento acabar sem motivo aparente e decide sair de Tóquio numa roadtrip.

A viagem termina em uma casa isolada nas montanhas, antigo estúdio de um famoso artista japonês, onde ele encontra uma misteriosa pintura (que dá título ao livro), inspirada na ópera “Don Giovanni”, de Mozart.

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Essa premissa simples, no entanto, serve de base para o desenvolvimento de um experimento mais solto, em várias frentes narrativas, repassando temas e elementos caros ao universo do autor.

Entram em cena um milionário excêntrico, um poço misterioso, uma adolescente voluntariosa, entidades que conectam realidades paralelas e muitas passagens sobre música clássica e o preparo de refeições simples.

A escolha de um narrador ligado às artes visuais, inédita entre os típicos protagonistas murakamianos, dá margem a uma discussão metafísica sobre o processo de criação e a potência da representação pictórica como forma de sublimar conflitos reprimidos. Essa abordagem é conduzida com mão leve, a partir de ideias e metáforas que se materializam nos personagens.

Em outra frente, Murakami faz a mais aberta homenagem ao escritor Francis Scott Fitzgerald, um de seus grandes ídolos, na medida em que uma de suas criações, o magnata da tecnologia Sr. Menshik, encarna uma versão atualizada de Jay Gatsby.

A transição entre muitos plots e diferentes estilos literários, tão bem estruturada em romances anteriores, como “Crônica do Pássaro de Corda”, aparece aqui menos coesa, como se o autor estivesse deixando as narrativas se desenvolverem de forma autônoma, mais centrado no processo do que no resultado. Essa autoindulgência, aparentemente deliberada, acaba enfraquecendo o conjunto.

Apesar das repetições e fios soltos, contudo, a leveza do texto e a destreza em contar histórias mantêm o leitor preso por mais de 600 páginas. Murakami é sempre uma boa companhia.

 

“O Assassinato do Comendador”

Haruki Murakami

Alfaguara,  360 págs., R$ 60

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