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Messi e injustiça

A história do futebol é quase sempre escrita por fragmentos. Flashes. Melhores momentos, números, resultados. A meritocracia profunda, repleta de conhecimento, de acompanhamento do que acontece no cotidiano, na maioria dos jogos, no decorrer destes, não costuma entrar em campo quando se pensa na edificação do senso comum – e aqui incluo boa parte da imprensa. Messi tem dado azar, neste sentido, nos últimos tempos. Para quem observa, com atenção, rodada após rodada, o futebol mundial, não há dúvidas; mas para os torcedores/comentaristas de “ocasião”, para aqueles que ligam a TV de quatro em quatro anos…

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O estar no lugar certo, no momento exato; o que depende de um encaixe intangível, do acaso, do coletivo, do simplesmente acontecer: não raramente o individual é apreciado por estes fatores, por misturas destes, e não pela aptidão, pela capacidade pessoal; pelos méritos puros; pelo talento mais genuíno. E neste processo, frequentemente se “acha argumentos” para fundamentar o que se quer, o que surge como um caminho “natural” até por osmose, e não o contrário: como diria Schopenhauer, encontramos motivos porque queremos; a razão, muito mais do que imaginamos, é serva da vontade.

É mais fácil construir discursos com “fatos”, “dados”; é difícil nadar contra a corrente dos “idiotas da objetividade”, como destacaria Nelson Rodrigues; é tortuoso por ora se apoiar simplesmente no jogo, no futebol. A compreensão do que seria uma espécie de essência e verdade deste esporte tão fascinante exige o exame de nuances, sensibilidade que transcende, e muito, os números. O que se chama de “poder de decisão” – e de ausência dele – não necessariamente é, no fundo, comparativamente, mais preparo psicológico. As circunstâncias precisam ajudar. Estar ali, para receber, para arrematar, se colocar em condições, é virtude, claro; mas para a concretização dela comumente é imperioso o encaixe outrora mencionado, o que sobrepuja o individual; e para o outro, muitas vezes esta oportunidade simplesmente não aparece – e não por culpa própria…

O futebol precisa deixar de escolher heróis e vilões, distribuir seus prêmios desprezando tanto a maioria das partidas – quase que dá a sensação: “se for para ser assim, por que elas acontecem?”; se baseando em excesso no que advém em anos bissextos ou, sei lá, em poucas quartas de Champions League, nos confrontos eliminatórios que parecem atrair não só toda a mídia como uma “torcida” nada iniciada. Futebol não é tão importante assim, poderíamos pensar. Talvez, por este prisma, “dispensável”, em certa acepção, seria a apreciação tão obsessivamente correta. Ok. Mas não deixa de ser injusto, errado…

Não torço contra nem – a priori – a favor da Argentina. Enquanto residir uma sensação de iminente injustiça no julgamento público de Lionel Messi, porém, pelo menos em alguma medida, uma pontinha de torcida pelos hermanos em mim permanecerá. Como seria com Pelé, Romário…

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