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Papo furado

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ANÚNCIO

Passou-se a falar bastante de marketing no futebol brasileiro nos últimos anos. Não necessariamente com intelecto, ciência, conteúdo. Achismos, clichês e invariavelmente a colocação do marketing como uma espécie de rei Midas, de Deus grego, de salvador da pátria…

Dentro dessa epidemia, do modismo assinalado, uma das coisas que mais se ouviu em tempos recentes é que seria preciso caprichar no entretenimento oferecido ao torcedor nas arenas, no chamado “game day”. Cheerleaders, show do intervalo, gincanas, promoções; câmera do beijo e outras apropriações da cultura americana no mais perfeito reflexo do complexo de vira-lata, para tirar Nelson Rodrigues e Ariano Suassuna, juntos, do túmulo. Depois da Copa, do padrão FIFA, e dos primeiros anos desta tentativa mais clara de simulacro, o que temos é o seguinte: a perda de identidade, de alma, em diversos sentidos, dos nossos estádios, e a apresentação de uma imitação extremamente mal-acabada de algo que, em outras culturas, em diferentes acepções, dá certo. Em outras palavras: já não seria correto babar ovo e procurar fazer igualzinho; pior ainda é realizar de uma maneira “feinha”, “pobrinha”, atrapalhada.

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No ano passado passei quase um mês nos EUA pesquisando vários aspectos do esporte de lá na costa Oeste. Acabo de voltar do mesmo país, de um período no qual fiz algo parecido mais para a região Leste. Nos jogos que presenciei, nas entrevistas que fiz nesta viagem mais recente, algo que já me acometia com frequência voltou mais forte: a noção de que no Brasil, noves fora o ridículo da cópia, e as mazelas da perda de identidade cultural, se fala que os clubes devem implementar essas questões nas partidas, em suas vidas, como se fosse algo que viesse do céu. De graça. Do nada. Para “atrair mais o torcedor”. Gente: 99,9% das ações que são feitas nos estádios e ginásios dos Estados Unidos não são ideias “gratuitas” das equipes, pagas por elas, para, “de repente”, apenas tornar a “experiência do fã mais agradável”. Cada gincana, cada brincadeira besta; cada patacoada comandada por um animador de torcida que fala em cada um dos milhares de tempos criados nos jogos justamente para isso tem por traz um patrocinador. Que investe. Que acredita que míseros segundos e rápidas, até indiretas menções, são dignas de um robusto pagamento.

Ações promocionais ligadas ao esporte, à música (…), não são entes à parte de uma sociedade. Fazem parte de um mercado, da realidade do capitalismo local. Existe um padrão de consumo em cada canto que se entrelaça a tudo isso. Cada país, cada sociedade, tem o seu. Será que clubes gigantes, com milhões de fanáticos seguidores, que sequer conseguem vender patrocinadores de suas camisas por quantias dignas teriam capacidade de comercializar uma ação de vinte segundos, por um valor razoável, na qual pessoas contratadas jogam camisas para os torcedores? Será que quem não consegue concretizar o básico, seria capaz de conquistar o específico, o “menor”, o “mais detalhado”?

Cadu Doné é comentarista esportivo da rádio Itatiaia e da TV Band Minas, filósofo e escritor.

 

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