Foco

‘Anjos’ de Santo André salvaram 192 vidas com doação de órgão

Para o enfermeiro Paulo César Ribeiro, a morte pode ser um recomeço. “Vejo a morte encefálica como possibilidade de vida para muita gente. Não é o fim, mas o renascimento”, afirma o profissional, que com a convicção de um salva-vidas comanda a equipe que procura por doadores de órgãos no CHM (Centro Hospitalar Municipal) de Santo André.

O trabalho incansável de Ribeiro e outros cinco enfermeiros e dois médicos, que trabalham de forma voluntária nesta função, deu vida nova a 192 pessoas desde 2013, quando o CIHT (Comissão Intra-hospitalar de Transplante) foi reativado.

Esta é a quantidade de órgãos captados de pacientes que tiveram morte cerebral na cidade no período. O trabalho da equipe rendeu em 2015 o sexto lugar no Estado de São Paulo para o CHM como hospital notificador e captador de órgãos. Em 2013, ele era o 33º. No ABC, o hospital é atualmente o que mais faz o trabalho. Apenas neste ano, foram nove doadores efetivados, que resultaram em 37 órgãos e tecidos, como coração, rim e córnea.

Recomendados

São Bernardo informou ter captado quatro doadores no mesmo período e São Caetano, nenhum.

doacao de orgao arte

Trabalho

As comissões intra-hospitalar são responsáveis por fazer visitas a UTIs (Unidades de Terapia Intensiva) e pronto-socorros e identificar pacientes com quadro clínico caminhando para morte encefálica. “Nem todas as notificações se tornam doadores. O diálogo com a família precisa ser feito desde o início”, disse.

Os órgãos captados são enviados para hospitais de referência, já que o ABC não possui nenhuma unidade que faz transplantes.

Apesar dos esforços regionais, a fila por um órgão é grande. No Estado, 15 mil aguardam pela oportunidade. A espera no ABC tem cerca de mil pacientes, de acordo com dados do início do ano da Central de Transplantes do Estado de São Paulo.

Ribeiro afirma que o processo de captação de órgãos é difícil e tem resistência até mesmo entre o corpo médico. “A abordagem não é fácil, tem que ter convencimento da equipe médica. A doação é um tema que não está na grade curricular da medicina e enfermagem. As famílias têm aderido mais, mas muitas já vêm de um processo desgastante.”

Hospital de Clínicas

O ABC pode ter no próximo ano uma unidade de referência para a realização de transplantes. Pacientes da região que precisam de um órgão são enviados para a capital atualmente.

O Hospital de Clínicas Municipal de São Bernardo pode vir a ser habilitado pelo Ministério da Saúde. De acordo com a prefeitura, ele possui infraestrutura adequada para a realização do procedimento, mas a decisão está fora da governabilidade do município. Essa é uma das especialidades que o HC planeja atuar, inicialmente com o transplante renal.

Mas a prefeitura diz que o Ministério da Saúde não tem habilitado hospitais nos últimos anos na região por conta da existência de centros de transplantes muito próximos, como o Hospital São Paulo e o Hospital de Clínicas, na capital.

Eloá foi divisor de águas

Ana e o jovem que recebeu os rins de Eloá | Nelson Antoine/Fotoarena/Folhapress

Ana Cristina Pimentel, 50 anos, ainda consegue contar com detalhes o dia em que ouviu dos médicos que sua filha Eloá Cristina Pimentel, de 15 anos, teve morte cerebral. A jovem entrou em 2008 para a história policial da cidade como o cárcere privado mais longo que se tem registro. Foram mais de 100 horas na mira do ex-namorado, que a atingiu com tiro fatal.

Mas por trás da trágica história, nascia também um divisor de águas para o transplante de órgãos na cidade. Com a autorização da família, Eloá teve sete órgãos doados. “Quando os médicos falaram sobre essa hipótese, não tive condições de responder. Mas fui para casa, e não consegui dormir. Meu filho havia me dito que a Eloá ficaria feliz com a doação e então autorizei”, disse Ana.

Após o caso da jovem, com grade repercussão na mídia, a retirada dos órgãos passou a ser feita na própria cidade, e não na capital, como era necessário antes. A morte de Eloá fez nascer também uma ativista na causa da doação. Ana Cristina dá palestras todos os anos na cidade sobre a importância dos transplantes. Nesta quinta-feira ela estará presente no simpósio organizado no CHM sobre o tema. Ele acontece das 8h às 12h, na avenida João Ramalho, 326. Vila Assunção. 

Tags

Últimas Notícias


Nós recomendamos